domingo, 6 de maio de 2012

O Sol Nascerá

Ele havia decretado: a sorrir levaria a vida. 

Em parceria a Elton Medeiros, Angelo de Oliveira, o nosso mestre Cartola, conseguiu dar forma a uma das mais belas canções da música popular brasileira. A curta declaração da composição possui o tempo suficiente para penetrar na alma da gente, estimulando um sentimento renovador; talvez fosse essa a sua intenção, ou não. A música nos remete a um dos tempos mais sofridos de Cartola. Na década de 40, viúvo, consumido por uma doença, provavelmente a meningite, e esquecido, o quadro era desesperançoso e merecia canção. Mas, diferente do que não foi, "O sol nascerá" surgiu de uma criação surpresa no ano de 1960,  resultado de um desafio proposto por Renato Agostini, amigo do músico, que o estimulou a escrever, junto a Elton, um samba improvisado. A brincadeira rendeu a posteridade da obra. Bossa Três, Nara Leão,  Paulinho da Viola, Jair rodrigues, Elis Regina, dentre outros grande nomes deram voz ao rabiscado rápido que, ainda hoje, ecoa como um canto à felicidade. O sol que anuncia a esperança, quem sabe, não ressurgiu das lembranças do compositor e caiu de jeito no desafio daquela tarde de 60. 

Enfim, fiquemos ao som do coloquialismo revestido de palavras rebuscadas. Nos deixemos levar pela ideia de que as tempestades passam, a mocidade passa, só o sol permanece e, ah, esse sim, não vai deixar de nascer nem tão cedo.

Um sorriso no rosto e a vida pela frente.

sexta-feira, 9 de março de 2012

Não digam que o racismo não existe mais

O preconceito racial, assim como muitos outros, é velado, disfarçado e muitos fingem que não existe. A nossa querida mídia brasileira, na contramão mais uma vez, reforça não só o racismo, mas faz parecer que ele já foi combatido ou, quando não, que quase não existe. Aí fica difícil. Como incentivar reflexões, questionamentos e, principalmente, a luta quando muitos estão com as duas mãos na frente dos olhos?

A história da escravidão, da omissão, da dor e do sofrimento não é esquecida; ficou no passado, mas reflete o presente. A partir do momento em que um ser humano se julga superior a outro levando em consideração a raça, é porque tem muita coisa troncha nessa humanidade.

Quantos negr@s você, universitário, vê em sua sala de aula? E você, estudante de pós-graduação, já fez trabalhos acadêmicos com quantos colegas negr@s? E olha que mais da metade da nossa população é composta por negros e negras. Agora, me diga: você ainda é contra as cotas raciais nas universidades? Aí, aparecem os argumentos: "ah, mas ai é inferiorizar o negro, a cota é que é racista". Eu, particularmente, não vejo assim. Relembrando a velha história, e vendo a situação atual, a necessidade de se abrir oportunidades, que nunca antes existiram, para brasileir@s é um primeiro passo para muitos que ainda precisam vir.

A sociedade nacional está em dívida com os negros e negras do nosso país, que também fazem parte da minha história e da sua. Deve-se reconhecer a importância que esses irmãos e irmãs tiveram para o desenvolvimento do Brasil. Entender que, entre as senzalas e as chibatadas, entre a discriminação e o racismo pesado da pós libertação dos escravos, esses e essas foram privados de direitos que meu pai e minha mãe nunca foram. A liberdade começa a partir do momento em que todos somos tratados como iguais, mas conscientes das diferenças e das peculiaridades históricas de cada. Dar oportunidade para que as gerações futuras sejam incluídas em um mesmo sistema, onde, caminharemos para uma situação na qual cotas não serão mais necessárias, estaremos de iguais para iguais convivendo em harmonia justamente por sermos diferentes (por mais inalcançável que possa parecer, é no caminho para conquistá-lo que encontram-se as mudanças e a luta,assim, é impulsionada).

Faz é tempo que deixamos de ser uma colonia portuguesa, mas o padrão Europeu - e também o da Terra do Tio Sam - "loiro, olhos azuis" (que nada tem a ver com a nossa realidade) impera nos comerciais, nos programas televisivos, nas capas das revistas. Criaram até o cabelo bom e o cabelo ruim, como se cabelo tivesse caráter. Ô danado pra querer padronizar tudo esse bicho homem. Com a imposição desses padrões, quem ta fora é diferente, anormal, ruim, feio, errado. 

Ai, sabem quem aparece? Os estereótipos! Eles tomaram conta do imaginário popular. O arquétipo do herói, que, claro, lembra bem o super-homem americano, é vinculado nas comunicações e a publicidade adora isso! 

Quando surgem casos do tipo: "Maria foi demitida por recusar-se a alisar os cabelos", alguém vem me dizer que é porque a empresa está no seu direito de manter uma boa imagem perante a sociedade e existem padrões a serem obedecidos nessa corporação. O direito da funcionária de ser quem ela é não existe, é isso? Ah, esqueci, é porque no Brasil não existe mais racismo, ta certo.

Trocar a discriminação pela inclusão e "o bom e o ruim" pela conscientização da diversidade na qual nos encontramos me parecem trocas justas. E, por favor, aquele argumento de "o preconceito está no olhos de quem vê" é tão furado quanto dizer que aqui o racismo não mais existe. Nos olhos de quem vê pode existir muito além do que uma frase clichê dessas, é só a gente atentar pra história, pra construção de todos esses esteriótipos que não surgem e nem surgiram à toa.

Devo fechar esse texto com o posicionamento de um ator global quando falava de um famoso dançarino negro: "Quando ele saia do palco, saia com 2 metros de altura, loiro e dos olhos azuis". Espantoso é ver muita gente colocando essa frase como não racista. Talvez, sejam as mesmas que pregam a inexistência do racismo no Brasil. O dito ator pode ter tido a boa intenção que fosse, mas fica claro o que está intrínseco nele (e em tantos outros Brasil afora). Aí, tem gente que vem dizer que essa crítica é coisa de "politicamente correto". Se querem falar de politicamente correto, ta certo, falem, mas também venham com os argumentos para dizer que aqui o racismo não existe mais.


Adicionando algo importante a ser esclarecido, retirado de uma Publicação do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas - Ibase - e do Observatório da Cidadania: "Quando as pessoas que defendem as cotas raciais falam de "raça" estão dando um sentindo político e social ao termo. Ou seja, referem-se às pessoas que se declaram ao IBGE como 'pretas' ou 'pardas'. Numa leitura política essas duas categorias de cores são entendidas como o segmento 'negro' da população, pois as pesquisas mostram que as trajetórias das pessoas 'pretas' e 'pardas' são muito mais próximas do que a das 'brancas'. A desigualdade e a discriminação racial precisam ser corrigidas com políticas públicas e não só com a ideia de que somos um 'paraíso racial'. "